Papa Paulo III
a todos os fieis cristãos,que as presentes letras virem,
saúde e benção apostólica.
A mesma Verdade, que nem pode enganar, nem ser enganada, quando mandava os
Pregadores de sua Fé a exercitar este ofício, sabemos que disse: Ide, e
ensinai a todas as gentes. A todas disse, indiferentemente, porque todas são
capazes de receber a doutrina de nossa Fé. Vendo isto, e invejando-o o
comum inimigo da geração humana, que sempre se opõe às boas obras, para que
pereçam, inventou um modo nunca dantes ouvido, pera estorvar que a palavra de
Deus não se pregasse às gentes, nem elas se salvassem. Pera isto, moveu alguns
ministros seus, que desejosos de satisfazer a suas cobiças, presumem afirmar a
cada passo, que os Indios das partes Ocidentais, e os do Meio dia, e
as mais gentes, que nestes nossos tempos tem chegado a nossa noticia, hão de
ser tratados, e reduzidos a nosso serviço como animais brutos, a título de que
são inábeis para a Fé Católica: e socapa de que são incapazes de
recebê-la, os põem em dura servidão, e os afligem, e oprimem tanto,
que ainda a servidão em que tem suas bestas, apenas é tão grande como
aquela com que afligem a esta gente.
Nós outros, pois, que ainda que indignos, temos as vezes de Deus na terra, e
procuramos com todas as forças achar suas ovelhas, que andam perdidas fora de
seu rebanho, pera reduzi-las a ele, pois este é nosso oficio; conhecendo
que aqueles mesmos Indios, como verdadeiros homens, não somente são capazes da
Fé de Cristo, senão que acodem a ela, correndo com grandissima prontidão,
segundo nos consta: e querendo prover nestas cousas de remédio
conveniente, com autoridade Apostólica, pelo teor das presentes letras,
determinamos, e declaramos, que os ditos Indios, e todas as mais gentes
que daqui em diante vierem à noticia dos Cristãos, ainda que estejam
fóra da Fé de Cristo, não estão privados, nem devem sê-lo, de sua
liberdade, nem do dominio de seus bens, e que não devem ser reduzidos a
servidão. Declarando que os ditos índios, e as demais gentes hão de ser
atraídas, e convidadas à dita Fé de Cristo, com a pregação da
palavra divina, e com o exemplo de boa vida.
E tudo o que em contrário desta determinação se fizer, seja em si de nenhum
valor, nem firmeza; não obstante quaisquer coisas em contrário, nem as
sobreditas, nem outras, em qualquer maneira.
Dada em Roma, ano de 1537, aos nove de Junho, no ano terceiro de nosso
Pontificado
(destaque nosso)